Por Julianne Ross
No topo de quase todo artigo que celebra a
diversidade do corpo, você irá encontrar alguma versão dos seguintes
comentários:
"Vocês não estariam promovendo um estilo de
vida pouco saudável?"
"Eu sou totalmente pela confiança, mas isto
não é apenas doentio?"
"Eu apenas não considero as pessoas gordas
atraentes, isto não faz de mim uma pessoa má".
"Eu não simpatizo com essas pessoas, elas
trazem isso com elas".
"Pense nas crianças!"
Isto se chama trollagem preocupada e deve parar. A
interseção entre questões de tamanho, saúde e perda de peso são muito mais
complicadas do que temos sido levados a imaginar; e esta falta de compreensão
transformou a discriminação baseada em peso num sério problema através do mundo.
O preconceito generalizado contra a gordura normalmente decorre de equívocos sobre saúde,
peso e positividade do corpo; e afeta negativamente milhões de pessoas todos os
dias.
As pessoas estão conscientes para tomar suas
próprias decisões em relação aos seus corpos, mas nós precisamos começar a
tratar com respeito pessoas de todos os tamanhos. Para começar, podemos
oferecer alguma informação atualizada sobre ser gordo.
1. O Índice de
Massa Corporal é Bobagem.
"Músculos pesam mais do que gordura". Este
é o adágio de quem malha, em todo lugar e, embora, tecnicamente devamos dizer
que músculos são mais densos do que gordura, isso apenas repete que: "Massa
muscular pode ter um grande efeito sobre o peso".
E, ainda, os cálculos do índice de massa muscular
não distinguem entre gordura e músculo, nem levam em conta coisas como tamanho
da formação geral de uma pessoa. Eles, no entanto, definem divisões arbitrariamente
nítidas entre o que é considerado normal, acima do peso e obeso, mesmo que
indivíduos com grande quantidade de massa muscular e pouca gordura entrem numa dessas
categorias. (Por outro lado, aqueles com um BMI baixo podem ter muito pouco de
músculo e alta porcentagem de gordura corporal, apesar serem classificados na
faixa "saudável").
Ao contrário da opinião popular, o BMI não é um
indicador de boa condição física. O matemático belga do século 19, Adolphe
Quetelet, tinha a intenção que sua fórmula fosse utilizada para avaliar o
estado das populações em geral, para o governo alocar melhor os recursos — e
não para calcular o excesso de gordura dos indivíduos.
No entanto, muitos médicos e seguradoras de saúde
continuam a atrelar o BMI a um marcador
oficial de saúde (apesar de ele ser considerado pela NPR como um "corte
numérico de 200 anos de idade, desenvolvido por um matemático que não era nem
mesmo um perito do pouco que se sabia sobre o corpo humano naquela época".
Embora talvez seja útil como um amplo guia para determinar onde o corpo de
alguém está em relação aos outros , é importante lembrar que o quadro pintado
pelo BMI está longe de ser completo.
2. Nem todas
as pessoas gordas têm má alimentação e pouco hábito de exercício.
O mundo está repleto de pessoas com hábitos abaixo
do ideal em termos de alimentação e, sim, algumas delas podem pesar mais que
outras. Mas, é importante lembrar o quão satisfeitas elas estão. Gordura não
significa automaticamente que uma pessoa seja um comedor compulsivo ou avessa a
exercícios.
É inteiramente possível que uma pessoa naturalmente
magra seja uma 'batata de sofá' e que outra, mais pesada, corra cinco milhas
por dia e tenha um fraco por couve, porque todos os corpos parecem diferentes (o
que é muito bom, à propósito); e porque o relacionamento entre saúde e peso é
complexo. Fatores como idade, genética, condições subjacentes, histórico de dieta
etc., tudo contribui para o número que vemos na balança e você nunca pode dizer
exatamente o que uma pessoa come e nem seus hábitos de exercício só de olhar
para ela.
Além do mais, ao se fazer uma suposição sobre a
dieta de alguém — seja uma pessoa gorda que come mal ou uma pessoa magra não
come nada — pode levar alguém a ter realmente problemas com a comida. Isto
não ajuda ninguém.
A relação de alguém com a comida não deve refletir
quem esse alguém é, enquanto ser humano, e nem destruir sua auto-estima em nome
da "saúde". Isso nunca vai funcionar (veja o Nº 6).
3. A gordura
por si mesma não é insalubre.
Se ser gordo fosse inerentemente negativo para nós,
então a perda de peso deveria trazer benefícios inumeráveis à saúde. Mas este
não é sempre o caso: Vários estudos dão conta da pouca conexão entre perda
de peso e redução do risco de mortalidade.
De fato, alguns estudos constataram que as pessoas
gordas são mais aptas a sobreviver a eventos cardíacos e estar acima do peso pode ter influência positiva na longevidade. E mais, a perda significativa de peso é muito difícil e
uma intensa dieta ioiô pode causar
também inúmeros problemas de saúde. A conversa sobre a relação peso e
riscos de saúde também frequentemente ignora os problemas que os magros ou
pessoas abaixo do peso podem enfrentar, a seu turno.
Extremos em ambas as extremidades do ponteiro da
balança trazem riscos e ninguém duvida que uma dieta balanceada e exercícios
regulares são coisas boas. Por si só, no entanto, o peso não é a questão. Muita
'junk food' em combinação com um estilo de vida sedentário é uma questão, e vai
continuar a ser, independente do peso de alguém.
4. Ser gordo
não significa falta de força de vontade.
Mesmo se ser gordo realmente contribuísse muito
para a crise de saúde, pesquisa aponta que a maioria das dietas não funciona a longo prazo — o que desbanca o
mito de que ser gordo é simplesmente ser preguiçoso.
O aumento no número de pessoas consideradas como
acima do peso não pode ser apontado como resultado de falta individual de
convicção. De fato, o editor do International
Journal of Obesity, Richard L. Atkinson, escreveu em 2005 que a crença de que a "obesidade é simplesmente resultante
da falta de força de vontade e de uma inabilidade de disciplinar os hábitos
alimentares não é mais defensável".
A neurocientista Sandra Aamodt destaca sem seu
recente TedTalk que indivíduos têm "pontos de ajuste" de peso
exclusivos. Perder peso fora dessa faixa é muito, muito difícil, e atribuir
isso à incapacidade de fazê-lo pela força de vontade é tanto desrespeitoso
quanto ignorante. Para colocar isso em perspectiva, entre 95-98% de quem faz
dieta têm reposição do peso que perderam e, algumas vezes, mais peso, num prazo
de três anos. Isto faz sentido: A. Janet Tomiyama da UCLA, disse que "se
dieta fizesse efeito não seria uma indústria de US$ 460 bilhões"; e que o
poder dos nossos genes sobre o nosso peso "é quase o mesmo" do que seu
poder sobre nossa altura.
A verdade é que nós ainda não sabemos exatamente
como perder peso saudavelmente e manter isso. Segundo Paul F. Campos escreveu
no LA Times, "O corpo
humano é um mecanismo muito mais complexo do que o motor de um carro e a
simples lógica por trás da ideia de que as pessoas vão perder peso ao comer
menos e se exercitar mais não é simples, mas simplista".
5. Discriminação
por tamanho é real.
De acordo com a National Association to Advance Fat Acceptance, a preocupação com
tamanho é a quarta maior forma de discriminação nos EUA. Apenas seis cidades,
além de Michigan, possuem leis contra isso.
Embora existam estereótipos em relação a todos os diferentes
tipos de corpos - baixinhos, magros,
altos e assim por diante - aqueles reservados para tamanhos de corpo maiores são
particularmente cruéis. Gordura é frequentemente associada a preguiça, pouca
higiene e estupidez, suposições que podem ter consequências graves nos âmbitos pessoal
e social.
No mundo do trabalho, os funcionários gordos
recebem menos promoções e podem ganhar menos do que suas contrapartes mais
magras. Na sala de aula, os alunos gordos são menos propensos a serem aceitos
na faculdade, mesmo com desempenho acadêmico compatível e, muitas vezes,
enfrentam baixas expectativas dos professores. As pessoas gordas tem até mesmo
que lidar com preconceitos no tribunal (jurados masculinos foram apontados como
mais rápidos para rotular mulheres gordas "reincidentes", com
"consciência de [seus] crimes"); e no escritório do médico pode afetar
a qualidade de tratamento que recebem.
Talvez a pior manifestação de discriminação por tamanho
venha na forma de bullying: Um estudo descobriu que as crianças obesas eram 65%
mais propensos a ser intimidadas do que seus pares.
Nas palavras de Madelyn Fernstrom, editora de saúde
e dieta da NBC, "é quase como se a obesidade fosse o último dos grupos
aceitáveis".
6. Vergonha de
ser gordo não ajuda e pode, de fato, fazer com as pessoas ganhem peso.
A vergonha de ser gordo, embora cruel, é outra
forma de bullying, que muitas vezes não está etiquetada como tal, porque as
pessoas acreditam que isso realmente vá estimular os outros a perder peso e, pela
lógica, normalmente tenderá a fazer com que alguém se torne mais saudável. Na
realidade, em geral, ocorre exatamente o oposto.
Segundo os pesquisadores, aqueles que experimentam
a discriminação de peso são mais propensos a se tornar ou a permanecer obesos. O
simples ato de chamar alguém de "gordo" pode ter este efeito: recente estudo de longo prazo da UCLA constatou
que jovens meninas que foram chamadas de gordas por alguém próximo com a idade
de 10 anos, tiveram mais propensão de se tornarem obesas mais tarde, em suas
vidas.
E isto não é o único fator surpreendente. Segundo Jeffrey
Hunger co-autor do estudo citado, "Ser rotulado de muito gordo pode levar
as pessoas a experimentar pessoalmente o estigma e a discriminação enfrentados
por pessoas com excesso de peso", uma experiência que, por sua vez,
"aumenta o estresse e pode levar a excessos".
Rebecca Puhl, vice-diretora de Política Alimentar e
Obesidade no Rudd Center da Universidade de Yale, repercutiu este sentimento
numa entrevista ao NBC News sobre estudo anterior que chegou à conclusão
semelhante: "Estigma e discriminação são realmente fatores de estresse ...
E nós sabemos que comer é uma reação comum ao estresse e à ansiedade".
7. Pessoas
gordas não estão desesperadas por encontros românticos.
As pessoas gordas também têm metas românticas em
suas vidas, como qualquer outra pessoa. Ser de um determinado tamanho, de modo
algum rouba alguém do seu direito de ser amado e respeitado por um parceiro.
Fim da história.
8. Nem todo
mundo quer ser magro.
Em março passado, Mindy Kaling orgulhosamente disse
à 'Vogue' que estava "sempre tentando perder 15 libras de peso. Mas eu
jamais preciso ser magra. Eu não quero
ser magra. Estou constantemente num estado de auto aperfeiçoamento, mas eu não fico apostando com meu corpo para
superar metas".
Ela não está sozinha. Beleza é subjetiva e, embora
ser magra seja bonito, beleza não tem que significar magreza.
Parte do problema é que a mídia oferece uma faixa
muito estreita de com o quê as pessoas realmente devem se parecer, e os corpos
que vemos na tela influenciam diretamente a nossa percepção dos corpos no mundo
real. Mas as pessoas vêm em todas as formas e tamanhos, e ninguém deveria ter
que dedicar cada momento livre tentando transformar seu corpo em algo que não é
para ser, a fim de se sentir atraente. Com imagens mais visíveis da
diversidade real, significativa, talvez as pessoas reconheçam que há mais de
uma maneira de ser bonita.
9. A palavra
gordo não é um insulto.
Vergonha de
ser gordo, claramente, não é útil, mas isso não é um apelo para se proibir esta
palavra no nosso vocabulário. A gordura deve ser tratada como um adjetivo, como
qualquer outro.
Na prática,
infelizmente, a palavra "gordo" pode magoar. E continuará a fazê-lo, enquanto
a sociedade insistir em fazer da gordura alvo de piadas e perpetuar o mito de
que isso é, eminentemente, um indesejável estado de ser.
Não permita
que isso aconteça. Parte dos pressupostos desafiadores de ser gordo
significa não pensar nesta palavra como um termo pejorativo; gordura não deve
ser um insulto, porque não há nada de errado em ser gordo.
Pelo fato
de ainda termos de eliminar inteiramente o estigma em torno da palavra, as
pessoas devem, naturalmente, referir-se a si mesmas usando um termo confortável. Mas,
um dia, talvez, dizer que alguém é "gordo" não será diferente do que
dizer que tenha cabelo loiro ou olhos castanhos.
Artigo original: Identities.Mic