sexta-feira, 10 de outubro de 2014

O Futuro do Trabalho traz muito comprometimento da parte das organizações

Por Ovum

Com a proximidade do Future of Work Summit, uma equipe da Ovum conversou com Peter Armstrong e Len Epp, cofundadores da Dashcube, Patrocinador de Inovação do evento, promovido pelo Informa Telecoms & Media, que acontece em Londres a 25 de novembro próximo. Numa fascinante, profunda discussão, eles exploram sua perspectiva sobre o futuro do local de trabalho e a tecnologia; e sua experiência atual.

Peter Armstrong: Eu acredito que o Futuro do Trabalho significa que equipes distribuídas não são opcionais; e as ferramentas e processos dos quais se precisa evoluam para o suporte e possam ser aplicadas efetivamente em equipes que não dispõem do luxo de estar no mesmo prédio. Acredito que o Futuro do Trabalho será fantástico, até para as forças sociais - as supostas "merecedoras milenares", desde que isso signifique que as pessoas não vão se contentar com ferramentas ruins e processos opressivos. Fundamentalmente, o Futuro do Trabalho será sobre pessoas e sobre o quão melhor usar a tecnologia para conectar pessoas e, em seguida, sair do caminho.

Ovum: Do ponto de vista da experiência de aprendizagem, qual foi a lição mais valiosa na sua carreira profissional, ou seu fracasso mais bem sucedido?

Peter Armstrong: Meu fracasso mais bem sucedido foi tentar produzir conceitos no meu primeiro livro, "Flexible Rails" ("Trilhos Flexíveis"), numa estrutura comercial. Embora a estrutura fosse tecnicamente forte, principalmente devido aos esforços do meu cofundador, o livro falhou espetacularmente como produto comercial. No entanto, a experiência levou à formação de minha 'boutique' de consultoria que, por sua vez, levou à criação do Leanpub, o que me permitiu trabalhar com meu velho amigo Len e conhecer Chris, o que resultou na criação conjunta da Dashcube. Em termos de lições, a principal delas foi me dar conta de fazer coisas que visam o público e que tentar melhorar, genuinamente, um pequeno subconjunto do mundo pode levar a sucessos totalmente inesperados.

Ovum: Qual tecnologia você gostaria de ver mudando a forma como fazemos negócios no futuro?

Peter Armstrong: Eu adoraria ver o Apple Watch (relógio de pulso da Apple) e seus inevitáveis imitadores a solucionar o desastre na segurança e a carteira estufada, o que é de fato a realidade dos dias modernos com os cartões de crédito. Len quer o mesmo para que se abram portas, mas, se isso apenas consertar os pagamentos, eu ficarei feliz. Pagar por coisas é um desastre.

Ovum: Descreva seu ambiente ideal de trabalho daqui a dez anos.

Len Epp: Em relação aos wearables (ou seja, dispositivos que usamos ou 'vestimos' em nosso próprio corpo), eu acredito que a grande mudança nos nossos ambientes de trabalho é que nós iremos usar relógios de pulso inteligentes como nossas chaves, não apenas para destrancar portas, mas também para desbloquear nossos dispositivos e até nossas apps. Isto terá um profundo impacto no modo como cada empresa gerencia segurança, ativos físicos, seu IP e seus dados.  Há um post num blog, escrito por mim há algumas semanas (antes do lançamento do Apple Watch), que dá mais detalhes de como os relógios de pulso se tornarão chaves (e carteiras).

Ovum: Em sua opinião, qual será a próxima grande mudança no modo como trabalhamos e na maneira como as empresas se envolvem com seus funcionários - e especificamente o modo como TI deve servir seus clientes?

Peter Armstrong: As empresas devem entender que precisam promover seus atuais empregados muito mais que do que seus novos empregados potenciais. 

Ovum: Nós iremos nos mover para uma forma além do email como ferramenta viável e confiável de negócios?

Len Epp: Eu acredito que a resposta é sim. Para finalidades internas vamos avançar muito além do email. Isso não significa, porém, que o e-mail será substituído em outras partes da nossa vida profissional.

Num futuro não muito distante, as comunicações internas entre equipes e mesmo entre empresas serão integradas numa rede de pessoal, projetos, documentos, ativos digitais e dados. Essencialmente, haverá uma "rede de trabalho", através da qual as pessoas se comunicarão num contexto inerentemente significativo.

Esta rede estabelece um ambiente muito diferente daquele do email, que, por natureza, multiplica o contexto a cada nova interação, cobrindo nosso mundo de trabalho com a proliferação de pedaços desconectados de mensagens, como numa colisão de lixo espacial. É por isso que gastamos tanto tempo com email: só tentando conectar fragmentos de trabalho isolados na configuração do email.

Agora, imagine, ao contrário, estabelecer um complexo projeto numa robusta app de planejamento; e então ter todo o seu time a se comunicar sobre seu trabalho na própria estrutura do projeto, ao invés de por email. Ao invés de interromper pessoas para atualizações de status numa tarefa, você pode apenas navegar para a tarefa e ver todas as últimas ações e comunicações. Note bem, não se trata de atualizações de trabalho sobre trabalho: o que você estaria vendo é comunicação real sobre o trabalho atual que está sendo feito pela sua equipe, em tempo real.

Isto terá muitas vantagens, inclusive o estabelecimento de visualizações em tempo real e retrospectivas da atividade da companhia. Essencialmente, quando as pessoas estão comunicando na mesma rede as coisas que elas estão planejando e realizando em seu trabalho, você pode ter uma "visão do espaço" de sua empresa - e também uma memória 'pesquisável' e passível de revisão. Quando, na mesma empresa, as pessoas param de trabalhar em silos individuais de email e começam conectando suas comunicações para os nós na rede (ao invés de escrever nas linhas de assunto), a informação poderosa emerge da rede, de maneira livre.

Ao mesmo tempo, o email ainda será usado nas comunicações externas, em particular para se relacionar com novos contatos, interagir com as contrapartes e se envolver em comunicações que tem regulamentações especiais, processuais ou mesmo importância legal.

Mas o email ainda permanecerá importante, por causa dos silos individuais de informação que, usados corretamente, têm extremo valor. Eu o usei para trabalhar numa F&A para um banco global de investimento e me recordo de quando conheci, inteiramente por acidente, um representante de vendas do sistema de gerenciamento de documentos de toda a empresa adotado por nós. O representante começou a se queixar comigo que as pessoas *ainda* estavam usando email para arquivo de documento, de uma forma bastante chocada. Eu tentei explicar a ele as razões porque todos fazemos isso.

O email permite que você arquive suas próprias cópias de documentos do jeito que quiser, de acordo com as categorias e seus hábitos de bagunça na mesa, que seguem suas preferências pessoais e interesses individuais.

Há um monte de informação contextual num email para ajudá-lo a se lembrar de coisas e encontrá-las, como data de envio, remetente, destinatário, assunto, o conteúdo do corpo da mensagem e mesmo se era um email com arquivo anexado etc. Quanto mais contextual são as conexões, reza a teoria, melhor está o cérebro para retomar coisas

Enviar um documento é percebido pelas pessoas como uma ação responsável, enquanto 'subir' (upload) um documento para uma base de dados não o é. Há um aspecto óbvio e familiar no email, uma vez que os emails acabam nas caixas de enviados e de recebidos. Na empresa, onde há regulações, revisões de bônus e mesmo as políticas de trabalho, esta prestação de contas é, na verdade, um dos aspectos mais importantes do e-mail.

Para a maioria dos propósitos internos, nossas contas de email são como cavernas para ocupação de um único indivíduo, das quais nós finalmente estamos emergindo para construir espaços mais sofisticados. Mas, para os propósitos da comunicação externa e organização pessoal, o email é mais como a roda: pode ser aperfeiçoado por avanços tecnológicos, mas a ideia básica está aí para ficar.

Ovum: À medida que a colaboração é posta no topo das agendas da maioria das organizações, qual você diria ser a falha mais comum na execução da nova tecnologia de colaboração/ferramentas na empresa?

Len Epp: A falha mais comum é resultado direto da perpetuação da má prática colaborativa, que envolve a separação do planejamento ou organização do nosso trabalho das nossas comunicações sobre o mesmo trabalho.

Esta má prática significa que nossas ferramentas de comunicação estão sempre fora de sintonia com nossas ferramentas de planejamento. A consequência disso é que ninguém realmente confia na ferramenta de planejamento, não importa o quão nova ela seja, pois é nossa comunicação, realmente, que representa os mais recentes conhecimento, decisões e atos. É difícil colaborar efetivamente quando nossas ferramentas de planejamento não refletem a realidade e, então, nós acabamos por interromper um ao outro o tempo todo, em fragmentados tópicos de email e, ainda, nos ressentindo do tempo perdido na atualização de nosso super fenomenal software de colaboração.
Ou seja, executar novas tecnologias baseadas nas mesmas velhas práticas está fadado ao fracasso, pois se não entrega uma prática fundamentalmente melhor, algo novo se transforma numa distração que não entrega benefício real.


***

Peter Armstrong é cofundador da Dashcube. Ele é autor de quatro livros, três sobre programação de computador e um sobre publicação. Seus livros foram traduzidos em vários idiomas. Antes da Dashcube, Peter foi desenvolvedor de software em startups do Vale do Silício por oito anos, antes de fundar a butique de consultoria em 2007 e ser cofundador da Leanpub em 2009. Peter é um frequente, apaixonado palestrante em conferências, não importando se tratam-se de palestras em conferências sobre o futuro do trabalho, publicação ou programação.

Len Epp, Cofundador da Dashcube. Depois de escrever um DPhil em inglês, Len trabalhou como banqueiro de investimentos em Londres, especialmente junto a utilities europeias e M&A. Em seguida, fundou uma empresa sem fins lucrativos no setor de artes, depois retornando ao seu país natal, o Canadá, em 2008. Liderou o desenvolvimento de atendimento ao usuário numa startup de publicação, Leanpub, por dois anos.

Fonte: Blog OvumLive 

quinta-feira, 9 de outubro de 2014

De volta ao futuro...

Transposto para o mundo organizacional, o conceito de metanoia perde o sentido de ‘penitência’ e se fortalece como ‘conversão espontânea’. Não basta dispor das novas tecnologias como ferramentas. Sem uma alteração, uma ‘conversão’ da mente dos colaboradores não se produz qualquer efeito de inovação


Por Jana de Paula


Desde que os relógios digitais mudaram os quatro dígitos – de 1999 para 2000 – vemos uma sucessão de acontecimentos que não deixam dúvidas. O século 21 chegou para valer. O novo século se parece menos com o seriado da Família Jetson – onde a tecnologia é soberana – e mais com filmes como “Barbarella”, “2001, Uma Odisséia no Espaço”, “Caçador de Androides”, “Exterminador do Futuro 2” etc., que anunciam o encontro com o desconhecido, a necessidade de se adaptar a situações nem sempre confortáveis…

Nesta primeira década do Novo Milênio, aos eventos causados pela própria humanidade se sucedem outros, alheios à nossa vontade. Um os mais recentes, a erupção do vulcão Eyjafjallajökull da Islândia (quem souber soletrar o nome ganha um doce), causou o mesmo caos aéreo – ou maior – do que o causado pelo ataque às Torres Gêmeas. Aliás, o “11 de Setembro” foi o primeiro de uma série de eventos críticos de grandes proporções que caracterizou a primeira década do século 21. Tsunami, enchentes, terremotos se inseriram no calendário com uma rapidez poucas vezes vista em anos recentes. Sem tempo de refazer o fôlego, o final da década de 2000 trouxe a reboque a crise econômica de 2008, que não deixou nada a dever à grande crise que abalou o mundo no início do século 20, o Crack de 1929. Tantos acontecimentos imprevistos mudaram o panorama. Governos e empresas passaram a incluir o imponderável em suas políticas e estratégicas. Mas o que tudo isso tem a ver com o assunto que nos interessa, ou seja, as telecomunicações?

Tudo. Enquanto a segunda metade do século 20 foi marcada pela mentalidade de que os grupos que detinham o poder eram os únicos capazes de definir as grandes linhas mestras de acontecimentos do planeta, o século 21 trouxe outra mentalidade.  Durante a segunda metade do século passado temia-se que o botão vermelho fosse acionado. Seria no Kremlin? Em Washington? Em Tóquio? Em Londres? Nesta época, a sociedade tinha pesadelos com o fim do mundo, como a personagem feminina do filme Exterminador do Futuro 2, que decidiu se armar até os dentes para impedir o fim do mundo e tinha sonhos com a bomba explodindo crianças inocentes.

Da mesma forma, estávamos acostumados que a infraestrutura das comunicações fosse fatiada por grupos autônomos. O satélite era para o meio do mar, o deserto, a montanha… Ou para quem tivesse muito dinheiro para instalar uma antena receptora. Telefone era a linha de voz que chegava às nossas casas. TV era aquela caixa catódica que a gente colocava na sala e diante da qual nos curvávamos passivamente. O cinema era o escurinho mágico, a telona cheia de mistérios. E o celular era aquele trambolhinho que tirava a gente do sufoco no meio da rua… Quando ‘pegava’…  A nova mentalidade implica ser mais atuante. Hoje todo mundo quer tudo isto a toda hora e de maneira ativa. Eu não quero mais sentar e assistir. Não quero só falar. Eu quero o filme recém lançado no cinema na tela do meu PC. Eu quero assistir novela no trem. E, enquanto os eventos naturais alheios à nossa vontade se sucedem, a crise econômica de 2008 detonou um processo interessante. Como as primeiras viagens à Lua trouxeram a miniaturização da eletrônica, a crise agilizou estratégias antes de médio prazo. A inclusão digital nos países emergentes é um exemplo. A massificação da tecnologia nos países pobres fazia parte da estratégia dos players – empresas que detém a infraestrutura, a tecnologia e o provimento de serviços e conteúdo. Mas a estratégia implicava, primeiramente, amortizar ao máximo os investimentos feitos no mercado filet mignon – ou seja, os países maduros.

A crise econômica, porém, mudou toda esta mentalidade. O jogo financeiro apresentou seu lado mais sinistro. E o soco no estomago do Crack de 2008 fez com que os planos de médio prazo para atender o próximo bilhão de clientes originários dos países em desenvolvimento se transformassem em plano de emergência. A população de alto poder aquisitivo se contraiu. O desemprego e a recessão travaram o elevado padrão de consumo desta população.

De acordo com dados do FMI, antes de 2008, não se registrava queda no PIB mundial há 40 anos. Muito menos atingidos pela crise econômica, os países emergentes se tornaram o alvo número 1. O próprio FMI concorda com a gente que a tendência entre os países desenvolvidos é de recuperação lenta e de que o crescimento virá dos emergentes. Os mercados do BRIC agora têm crescimento destacado na economia mundial. E fora Venezuela e Porto Rico, o FMI aponta que todos os outros países da América Latina tendem a acusar crescimento em médio prazo.

O setor de TI e Telecom – que detém parte da infraestrutura dos novos serviços de comunicações – foi um dos que melhor se saíram na fase imediata do pós-crise. Dados da IDC dão conta de que este setor respondeu por 7,5% dos US$ 4 trilhões de negócios gerados pela economia mundial em 2009, graças a seu faturamento de US$ 2,9 bilhões, em todo o mundo. Mesmo sendo este faturamento inferior ao período antes de 2008, ele demonstra sua importância no crescimento da economia mundial nos próximos anos.

De acordo com estudo da IDC realizado entre fevereiro e março de 2010, embora 51% das empresas brasileiras tenham reduzido custos e revistos processos, elas também tiveram aumento no orçamento de TI/telecom. Para o ano que vem, a estimativa da consultoria é que as empresas brasileiras vão crescer 10%. Isto é menos do que o crescimento estimado para China e Índia. Mas é mais do que a expectativa de crescimento global ou da Europa.

No caso dos EUA, a perspectiva de crescimento para a próxima década vai ser gradativamente menor nos EUA. De acordo com o FED, em 2020, a China vai ser a maior potência mundial. E em 2050 a China vai responder por 50% do PIB mundial, contra os países do G-20, que representarão 25% do PIB mundial. Capturar o próximo bilhão de consumidores digitais no BRIC hoje é coisa séria.  Neste cenário, então, duas coisas chamam atenção:

1) A mudança de estratégia dos grandes players mundiais, forçada pelo advento da crise de 2008. 2) A importância de capturar os mercados dos países emergentes.A mudança pode ser sentida em vários aspectos. Por exemplo, no forte movimento de fusões, aquisições, balanços com resultados apenas razoáveis e que levam à busca de novas fontes de receitas.  De fato parece que, para o setor de tecnologia, o Terceiro Milênio começa na segunda década do século 21. A crise econômica trouxe fortes mudanças de cenário, em termos de investimentos. Os acionistas, também usuários de tecnologia, vêm o surgimento de novos jardins para aplicar seu dinheiro, mas as dificuldades econômicas globais forçam que se assuma um comportamento de cautela e pragmatismo.

Mas, a despeito da crise, o mercado usuário cresce e demanda os novos serviços a preços palatáveis – porque o regime de engorda das receitas está nos países emergentes: população densa com baixa renda per capta. Estes novos usuários têm perfil diverso das segmentações de público dos mercados europeus. Ao contrário destes, o consumidor de tecnologia dos países emergentes dá menos destaque às marcas e, mais, ao conceito BBB – bom, bonito e barato. Quem atua em novas tecnologias já sabe: não há um pacote de serviços – seja ele prestado por uma operadora de telecom, uma prestadora de TV a cabo, um fornecedor de serviços de satélite, um provedor de internet (pequeno, médio, grande ou gigantesco) ou um fabricante (de chips, equipamentos ou dispositivos) que não inclua em suas estratégias de negócios imediatas, de médio e longo prazo a MOBILIDADE e a MÍDIA (TV, broadcast, IPTV, videovigilância) etc. Descobrir a melhor tecnologia e os pacotes mais atraentes para atrair o grande público que cresce de forma expoente junto às classes mais baixas dos países emergentes e os sempre ávidos e sofisticados públicos de classes A e B de quaisquer regiões é o Xangrilá, o Santo Gral, “a” busca.

O que deve ter em mente?  Que hoje em dia não se pode pensar em desenvolvimento econômico sem inclusão digital e sem controle do meio ambiente.

O autor do livro “Triple Bottom Line”, Andrew Savitz, diz o seguinte: “Na verdade a recessão, em certo sentido, tem aumentado os riscos para as empresas que poluem e que não são suficientemente atentas a comunidades ou aos trabalhadores. Neste momento existem pessoas muito insatisfeitas em empresas, o que significa que qualquer erro pode ser amplificado e transbordará para a opinião pública”. Ele aponta os benefícios para as empresas que continuam a desenvolver suas estratégias sustentáveis: “Ao mesmo tempo, essa situação [de crise] abre oportunidades para empresas que já descobriram o seu “sweet spots”: a intersecção que faz crescer seus negócios e interesses junto aos interesses públicos”, conclui.

Para melhor compreendermos este cenário, naveguemos um pouco no mundo das ideias.  Em quê as empresas estão pensando para mudar suas estratégias? A gente não estaria longe da realidade se dissesse que em tudo.  As novas abordagens chamadas holísticas – de previsões com visão mais global, de conjunto, fazem parte das estratégias de muitos destes titãs que nos interessam, ou seja, o pessoal de satélite, de cabo, de telefonia, fabricantes de equipamentos e de dispositivos, fornecedores de serviços e fornecedores e criadores de conteúdo. Para vocês terem uma noção de até onde os responsáveis pelas empresas mergulham na busca de novos conceitos, vamos citar um exemplo. Hoje em dia elas contratam a peso de ouro especialistas aptos no conceito de gerenciamento por metanoia. De origem grega, o significado é de conversão, no sentido de mudança de uma situação estagnada para outra, cujo processo de transformação implica cooperação, de modo que um novo ambiente traga vigor a determinado organismo ou organização.

De cunho religioso, espiritual, a metanoia era o processo de reconhecimento do erro, conscientização da necessidade de uma mudança interna ao qual se seguiria a iluminação, que traria a habilidade de receber o sopro de vida, a centelha de luz. Ou seja, mais do que o mero reconhecimento do ‘pecado’, a metanoia implica num esforço consciente de iluminação.

Transposto para o mundo organizacional, o conceito perde o sentido de ‘penitência’ e se fortalece como ‘conversão espontânea’. Não basta dispor das novas tecnologias como ferramentas. Sem uma alteração, uma ‘conversão’ da mente dos colaboradores não se produz qualquer efeito de inovação. É preciso interiorizar não apenas novos processos ou tecnologias, mas todo o conceito de Terceiro Milênio para se produzir a metanoia no competitivo ambiente organizacional. Aplicada em toda sua essência, a metanoia leva a uma mudança no próprio conceito de competitividade. É um novo tipo de competitividade. 

Então é como se, no momento, se processasse o rompimento de universos paralelos: verdades que não se cruzam, conceitos que se contradizem, interesses comerciais que se chocam etc. Cresce a importância do bem estar do funcionário. E não só do seu bem estar, mas de aperfeiçoar sua experiência de trabalho, de modo que o crescimento da receita e dos lucros da empresa seja acompanhado da própria evolução do indivíduo, como profissional e como pessoa. Significa ter o cliente, o usuário final como peça chave e atuante em todo o ciclo do negócio. E, na sequencia, ocorre o tal movimento de conversão para um ambiente mais harmônico, mais abrangente e menos beligerante.
Eu falei que ia dar apenas um exemplo. Mas vamos a um segundo. Outra mostra flagrante da mudança drástica que o setor vem sofrendo na última década é a evolução do ranking das marcas mais famosas. Das marcas ‘tech’ mais valiosas, junto a antigos integrantes, como a IBM, primeira da lista, Microsoft (2ª) e Dell (6º) estão nomes que simplesmente não existiam no século passado. Como Google, e-Bay e Yahoo! A Apple, em 4º, é um caso muito interessante. De produtora de high tech para iniciados, hoje ela é pop, desde que começou a lançar sua linha i (iPOD, iPhone, iPAD etc.).

O caso das operadoras de telefonia móvel é mais flagrante desta mudança de eixo, digamos assim. A China Mobile ocupa a primeira posição, tendo colocado para escanteio a inglesa Vodafone, do BT Group. Aliás, reparem bem na lista – fora a própria Vodafone, tem mais 04 operadoras móveis europeias DT (da Alemanha), Telenor, sueca, e Telefônica, espanhola, as outras 6 que constam da lista das top 10 são de países emergentes: América Móvil, do México (do nosso companheiro Carlos Slim), Barthi Airtel e Reliance da Índia, China Unicom e System Group, da Rússia que pertence à região emergente da Europa. Especificamente, o Brasil não consta esta lista, mas está incluído com a Telefônica, pois é sabido que é na América do Sul que a holding espanhola fatura de fato. Inclusive, uma piada velha do setor, na época da privatização das telecomunicações é que estaria se formando um novo Tratado de Tordesilhas, desta vez em telefonia móvel e fixa. Já que Telefônica e sua similar portuguesa, a PT, haviam adquirido o filé mignon brasileiro, ou seja, a cidade e o estado de São Paulo. Tanto assim, que o Lula esteve conversando com o CEO da PT, tentando sensibilizá-lo para a necessidade de a banda larga ir além dos ricos. Certamente ele se referia ao mercado de São Paulo, onde para fazer inclusão digital com rapidez será necessário usar o backbone destas duas empresas.

Também quanto aos fornecedores de infraestrutura – ou vendors, como são mais conhecidos - houve dança de cadeiras. Ao velho álbum de figurinhas que tinha Ericsson, Alcatel-Lucent, Motorola e Cisco, vieram se juntar nomes asiáticos: Huawei e ZTE estão comendo mercado adoidado e não é só no mundo emergente não. Os mercados maduros também gostam de um contrato com um bom fornecedor a preços mais palatáveis. Isto é também verdade no caso específico do WiMAX. Por ser tecnologia emergente, são muitos os players “de fora do jardim murado” como se costuma dizer. Além das próprias Huawei e ZTE que também atuam nesta área, corre muito bem a israelense Alvarion. Aliás, o mercado de alta tecnologia tem viabilizado uma série de empresas israelenses de sucesso, à medida em que ele se abre e dentro para fora. Desde há muito os israelenses são especialistas em tecnologia de mobilidade. É sempre bom ficar de olho no que eles aprontam. Nos alemães também.
Então toda esta explicação sobre os fatores chaves da mudança de cenário foi para demonstrar a transformação porque passa o chamado ecossistema do mercado. Ou seja, não dá mais para ficar no belo jardim murado, contemplando seu crescimento constante (graças aos clientes fiéis). Está todo mundo de tacape em punho, prontos para a briga por novos mercados.

Querem exemplos?  Numa apresentação ao mercado, ocorrida em maio, na Bolsa de Estocolmo, Hans Vestberg, CEO da Ericsson, uma das mais tradicionais fornecedores do mundo de telecom, salientou que, embora as telcos continuem como prioridade em sua estratégia de atuação, há “vigor” (palavra deles) para abordar clientes como TV a cabo, governos, saúde, transporte e utilities. “Estes são setores onde há uma enorme necessidade de serviços de telecomunicações”, afirmou ele. Governo e mercado de difusão de vídeos constam de todas as novas estratégias de quem fornece insumos e serviços de comunicação. Vou dar também alguns exemplos sobre mercado financeiro, embora a contragosto. Trata-se de um mercado muito volátil e sensível. E não se conhece ainda as conseqüências do acordo de urânio feito entre o Brasil e a Turquia junto aos investidores mundiais. Mas a Copa do Mundo e as Olimpíadas estão aí e isto de fato é um ponto positivo muito forte. Além disso, são grupos fortes que lidam com muito dinheiro… A gente imagina que a preocupação deles seja maior do que a nossa…

Quando a Associação de Empresas de Investimento (AIC), com sede em Londres, pediu – em dezembro passado - que os seus gestores de fundos de investimento apontassem os mercados com perspectivas de alto desempenho para 2010, os mercados emergentes ficaram no topo com 35% dos votos. Entre as regiões, a América Latina, com 22%, e o Extremo Oriente, com 18% dos votos.

Slim Feriani, diretor executivo da Advance Emerging Capital disse na ocasião que “o desempenho das ações dos mercados emergentes ultrapassaram generosamente o dos mercados desenvolvidos nos últimos cinco anos e esperamos que esta alta performance continue durante os próximos cinco anos”.

O executivo usou uma expressão bem característica de que os mercados emergentes são os “vencedores relativos” da crise do subprime e da recessão resultante. Uma das razões desta situação é que a renda das famílias dos mercados emergentes nunca foi tão forte em comparação com países desenvolvidos, como atualmente. E a firma de investimentos dos EUA acredita que este desenvolvimento econômico e o crescimento dos lucros das empresas continuarão a ultrapassar facilmente o mundo desenvolvido, tanto em termos nominais quanto reais no futuro previsível”.

Outra gestora mundial de fundos de ações, a Asset Management, acredita que os mercados emergentes vieram para ficar. “A crescente pressão sobre os consumidores ocidentais e as finanças públicas são susceptíveis de se traduzir em dados macroeconômicos mais fracos e em pressão sobre a receita de muitos anos. Os investidores que buscam o crescimento em longo prazo nos mercados emergentes tendem a olhar de forma cada vez mais atraente e já vemos um mar de mudanças nas atitudes de risco para o investimento nestes mercados”.

E como comprova o fator número dois, a busca não é apenas por novos mercados usuários, mas novos mercados geográficos. Cameron escolheu o Brasil para o lançamento mundial do filme Avatar. Popstars de primeira linha colocam as cidades dos países sul-americanos no topo das agendas de suas turnês.
Escrito em 22 de Junho de 2010