sexta-feira, 10 de outubro de 2014
quinta-feira, 9 de outubro de 2014
De volta ao futuro...
Transposto para o mundo organizacional, o conceito de metanoia perde o sentido de ‘penitência’ e se fortalece como ‘conversão espontânea’. Não basta dispor das novas tecnologias como ferramentas. Sem uma alteração, uma ‘conversão’ da mente dos colaboradores não se produz qualquer efeito de inovação
Por Jana de Paula
Desde que os relógios digitais
mudaram os quatro dígitos – de 1999 para 2000 – vemos uma sucessão de
acontecimentos que não deixam dúvidas. O século 21 chegou para valer. O novo
século se parece menos com o seriado da Família Jetson – onde a tecnologia é
soberana – e mais com filmes como “Barbarella”, “2001, Uma Odisséia no Espaço”,
“Caçador de Androides”, “Exterminador do Futuro 2” etc., que anunciam o encontro com o
desconhecido, a necessidade de se adaptar a situações nem sempre confortáveis…
Nesta
primeira década do Novo Milênio, aos eventos causados pela própria humanidade
se sucedem outros, alheios à nossa vontade. Um os mais recentes, a erupção do
vulcão Eyjafjallajökull da Islândia (quem souber soletrar o
nome ganha um doce), causou o mesmo caos aéreo – ou maior – do que o causado
pelo ataque às Torres Gêmeas. Aliás, o “11 de Setembro” foi o primeiro de
uma série de eventos críticos de grandes proporções que caracterizou a primeira
década do século 21. Tsunami, enchentes, terremotos se inseriram no calendário
com uma rapidez poucas vezes vista em anos recentes. Sem tempo de refazer o
fôlego, o final da década de 2000 trouxe a reboque a crise econômica de 2008,
que não deixou nada a dever à grande crise que abalou o mundo no início do
século 20, o Crack de 1929. Tantos acontecimentos imprevistos mudaram o
panorama. Governos e empresas passaram a incluir o imponderável em suas
políticas e estratégicas. Mas o que tudo isso tem a ver com o assunto que nos
interessa, ou seja, as telecomunicações?
Tudo. Enquanto
a segunda metade do século 20 foi marcada pela mentalidade de que os grupos que
detinham o poder eram os únicos capazes de definir as grandes linhas mestras de
acontecimentos do planeta, o século 21 trouxe outra mentalidade. Durante a segunda metade do
século passado temia-se que o botão vermelho fosse acionado. Seria no Kremlin?
Em Washington? Em Tóquio? Em Londres? Nesta época, a sociedade tinha pesadelos
com o fim do mundo, como a personagem feminina do filme Exterminador do Futuro
2, que decidiu se armar até os dentes para impedir o fim do mundo e tinha
sonhos com a bomba explodindo crianças inocentes.
Da mesma forma, estávamos acostumados que a infraestrutura
das comunicações fosse fatiada por grupos autônomos. O satélite era para o meio
do mar, o deserto, a montanha… Ou para quem tivesse muito dinheiro para
instalar uma antena receptora. Telefone era a linha de voz que chegava às
nossas casas. TV era aquela caixa catódica que a gente colocava na sala e
diante da qual nos curvávamos passivamente. O cinema era o escurinho mágico, a
telona cheia de mistérios. E o celular era aquele trambolhinho que tirava a
gente do sufoco no meio da rua… Quando ‘pegava’… A nova mentalidade implica ser mais
atuante. Hoje todo mundo quer tudo isto a toda hora e de maneira ativa. Eu não
quero mais sentar e assistir. Não quero só falar. Eu quero o filme recém
lançado no cinema na tela do meu PC. Eu quero assistir novela no trem. E,
enquanto os eventos naturais alheios à nossa vontade se sucedem, a crise
econômica de 2008 detonou um processo interessante. Como as primeiras viagens à
Lua trouxeram a miniaturização da eletrônica, a crise agilizou estratégias
antes de médio prazo. A inclusão digital nos países emergentes é um exemplo. A
massificação da tecnologia nos países pobres fazia parte da estratégia dos
players – empresas que detém a infraestrutura, a tecnologia e o provimento de
serviços e conteúdo. Mas a estratégia implicava, primeiramente, amortizar ao
máximo os investimentos feitos no mercado filet mignon – ou seja, os países
maduros.
A crise econômica, porém, mudou toda esta mentalidade. O
jogo financeiro apresentou seu lado mais sinistro. E o soco no estomago do
Crack de 2008 fez com que os planos de médio prazo para atender o próximo
bilhão de clientes originários dos países em desenvolvimento se transformassem
em plano de emergência. A população de alto poder aquisitivo se contraiu.
O desemprego e a recessão travaram o elevado padrão de consumo desta população.
De acordo com dados do FMI, antes de 2008, não se registrava
queda no PIB mundial há 40 anos. Muito menos atingidos pela crise econômica, os
países emergentes se tornaram o alvo número 1. O próprio FMI concorda com a
gente que a tendência entre os países desenvolvidos é de recuperação lenta e de
que o crescimento virá dos emergentes. Os mercados do BRIC agora têm
crescimento destacado na economia mundial. E fora Venezuela e Porto Rico, o FMI
aponta que todos os outros países da América Latina tendem a acusar crescimento
em médio prazo.
O setor de TI e Telecom – que detém parte da
infraestrutura dos novos serviços de comunicações – foi um dos que melhor se
saíram na fase imediata do pós-crise. Dados da IDC dão conta de que este setor
respondeu por 7,5% dos US$ 4 trilhões de negócios gerados pela economia mundial
em 2009, graças a seu faturamento de US$ 2,9 bilhões, em todo o mundo. Mesmo
sendo este faturamento inferior ao período antes de 2008, ele demonstra sua
importância no crescimento da economia mundial nos próximos anos.
De acordo com estudo da IDC realizado entre fevereiro e
março de 2010, embora 51% das empresas brasileiras tenham reduzido custos e
revistos processos, elas também tiveram aumento no orçamento de TI/telecom.
Para o ano que vem, a estimativa da consultoria é que as empresas brasileiras vão
crescer 10%. Isto é menos do que o crescimento estimado para China e Índia. Mas
é mais do que a expectativa de crescimento global ou da Europa.
No caso dos EUA, a perspectiva de crescimento para a
próxima década vai ser gradativamente menor nos EUA. De acordo com o FED, em 2020,
a China vai ser a maior potência mundial. E em 2050
a China vai responder por 50% do PIB mundial, contra os países do G-20, que
representarão 25% do PIB mundial. Capturar o próximo bilhão de consumidores
digitais no BRIC hoje é coisa séria. Neste
cenário, então, duas coisas chamam atenção:
1) A
mudança de estratégia dos grandes players mundiais, forçada pelo advento da
crise de 2008. 2) A importância
de capturar os mercados dos países emergentes.A mudança pode ser sentida em
vários aspectos. Por exemplo, no forte movimento de fusões, aquisições,
balanços com resultados apenas razoáveis e que levam à busca de novas fontes de
receitas. De fato parece
que, para o setor de tecnologia, o Terceiro Milênio começa na segunda década do
século 21.
A crise econômica trouxe fortes mudanças de cenário, em termos de
investimentos. Os acionistas, também usuários de tecnologia, vêm o surgimento
de novos jardins para aplicar seu dinheiro, mas as dificuldades econômicas
globais forçam que se assuma um comportamento de cautela e pragmatismo.
Mas,
a despeito da crise, o mercado usuário cresce e demanda os novos serviços a
preços palatáveis – porque o regime de engorda das receitas está nos países
emergentes: população densa com baixa renda per capta. Estes novos usuários têm
perfil diverso das segmentações de público dos mercados europeus. Ao contrário
destes, o consumidor de tecnologia dos países emergentes dá menos destaque às
marcas e, mais, ao conceito BBB – bom, bonito e barato. Quem atua em novas
tecnologias já sabe: não há um pacote de serviços – seja ele prestado por uma
operadora de telecom, uma prestadora de TV a cabo, um fornecedor de serviços de
satélite, um provedor de internet (pequeno, médio, grande ou gigantesco) ou um
fabricante (de chips, equipamentos ou dispositivos) que não inclua em suas
estratégias de negócios imediatas, de médio e longo prazo a MOBILIDADE e a
MÍDIA (TV, broadcast, IPTV, videovigilância) etc. Descobrir a melhor
tecnologia e os pacotes mais atraentes para atrair o grande público que cresce
de forma expoente junto às classes mais baixas dos países emergentes e os
sempre ávidos e sofisticados públicos de classes A e B de quaisquer regiões é o
Xangrilá, o Santo Gral, “a” busca.
O que deve ter em mente? Que hoje em dia não se pode
pensar em desenvolvimento econômico sem inclusão digital e sem controle do meio
ambiente.
O autor do livro “Triple Bottom Line”, Andrew Savitz, diz
o seguinte: “Na verdade a recessão, em certo sentido, tem aumentado os
riscos para as empresas que poluem e que não são suficientemente atentas a
comunidades ou aos trabalhadores. Neste momento existem pessoas muito
insatisfeitas em empresas, o que significa que qualquer erro pode ser
amplificado e transbordará para a opinião pública”. Ele aponta os
benefícios para as empresas que continuam a desenvolver suas estratégias
sustentáveis: “Ao mesmo tempo, essa situação [de crise] abre oportunidades para
empresas que já descobriram o seu “sweet spots”: a intersecção que faz crescer
seus negócios e interesses junto aos interesses públicos”, conclui.
Para melhor compreendermos este cenário, naveguemos um
pouco no mundo das ideias. Em
quê as empresas estão pensando para mudar suas estratégias? A gente não estaria
longe da realidade se dissesse que em tudo. As
novas abordagens chamadas holísticas – de previsões com visão mais global, de
conjunto, fazem parte das estratégias de muitos destes titãs que nos
interessam, ou seja, o pessoal de satélite, de cabo, de telefonia, fabricantes
de equipamentos e de dispositivos, fornecedores de serviços e fornecedores e
criadores de conteúdo. Para vocês
terem uma noção de até onde os responsáveis pelas empresas mergulham na busca
de novos conceitos, vamos citar um exemplo. Hoje em dia elas contratam a peso
de ouro especialistas aptos no conceito de gerenciamento por metanoia. De
origem grega, o significado é de conversão, no sentido de mudança de uma
situação estagnada para outra, cujo processo de transformação implica
cooperação, de modo que um novo ambiente traga vigor a determinado organismo ou
organização.
De cunho religioso, espiritual, a metanoia era o processo
de reconhecimento do erro, conscientização da necessidade de uma mudança
interna ao qual se seguiria a iluminação, que traria a habilidade de receber o
sopro de vida, a centelha de luz. Ou seja, mais do que o mero reconhecimento do
‘pecado’, a metanoia implica num esforço consciente de iluminação.
Transposto para o mundo organizacional, o conceito perde
o sentido de ‘penitência’ e se fortalece como ‘conversão espontânea’. Não basta
dispor das novas tecnologias como ferramentas. Sem uma alteração, uma
‘conversão’ da mente dos colaboradores não se produz qualquer efeito de
inovação. É preciso interiorizar não apenas novos processos ou tecnologias, mas
todo o conceito de Terceiro Milênio para se produzir a metanoia no competitivo
ambiente organizacional. Aplicada em toda sua essência, a metanoia leva a uma
mudança no próprio conceito de competitividade. É um novo tipo de
competitividade.
Então é como se, no momento, se processasse o rompimento
de universos paralelos: verdades que não se cruzam, conceitos que se
contradizem, interesses comerciais que se chocam etc. Cresce a importância
do bem estar do funcionário. E não só do seu bem estar, mas de aperfeiçoar sua
experiência de trabalho, de modo que o crescimento da receita e dos lucros da
empresa seja acompanhado da própria evolução do indivíduo, como profissional e
como pessoa. Significa ter o cliente, o usuário final como peça chave e
atuante em todo o ciclo do negócio. E, na sequencia, ocorre o tal
movimento de conversão para um ambiente mais harmônico, mais abrangente e menos
beligerante.
Eu falei que ia dar apenas um exemplo. Mas vamos a um
segundo. Outra mostra flagrante da mudança drástica que o setor vem sofrendo na
última década é a evolução do ranking das marcas mais famosas. Das marcas
‘tech’ mais valiosas, junto a antigos integrantes, como a IBM, primeira da
lista, Microsoft (2ª) e Dell (6º) estão nomes que simplesmente não existiam no
século passado. Como Google, e-Bay e Yahoo! A Apple, em 4º, é um caso muito
interessante. De produtora de high tech para iniciados, hoje ela é pop, desde
que começou a lançar sua linha i (iPOD, iPhone, iPAD etc.).
O caso das operadoras de telefonia móvel é mais flagrante
desta mudança de eixo, digamos assim. A China Mobile ocupa a primeira posição,
tendo colocado para escanteio a inglesa Vodafone, do BT Group. Aliás, reparem
bem na lista – fora a própria Vodafone, tem mais 04 operadoras móveis europeias
DT (da Alemanha), Telenor, sueca, e Telefônica, espanhola, as outras 6 que
constam da lista das top 10 são de países emergentes: América Móvil, do México
(do nosso companheiro Carlos Slim), Barthi Airtel e Reliance da Índia, China
Unicom e System Group, da Rússia que pertence à região emergente da Europa. Especificamente, o Brasil não consta
esta lista, mas está incluído com a Telefônica, pois é sabido que é na América
do Sul que a holding espanhola fatura de fato. Inclusive, uma piada velha do
setor, na época da privatização das telecomunicações é que estaria se formando
um novo Tratado de Tordesilhas, desta vez em telefonia móvel e fixa. Já que
Telefônica e sua similar portuguesa, a PT, haviam adquirido o filé mignon
brasileiro, ou seja, a cidade e o estado de São Paulo. Tanto assim, que o Lula
esteve conversando com o CEO da PT, tentando sensibilizá-lo para a necessidade
de a banda larga ir além dos ricos. Certamente ele se referia ao mercado de São
Paulo, onde para fazer inclusão digital com rapidez será necessário usar o
backbone destas duas empresas.
Também quanto aos fornecedores de infraestrutura – ou
vendors, como são mais conhecidos - houve dança de cadeiras. Ao velho álbum de
figurinhas que tinha Ericsson, Alcatel-Lucent, Motorola e Cisco, vieram se
juntar nomes asiáticos: Huawei e ZTE estão comendo mercado adoidado e não é só
no mundo emergente não. Os mercados maduros também gostam de um contrato com um
bom fornecedor a preços mais palatáveis. Isto é também verdade no caso
específico do WiMAX. Por ser tecnologia emergente, são muitos os players “de
fora do jardim murado” como se costuma dizer. Além das próprias Huawei e ZTE
que também atuam nesta área, corre muito bem a israelense Alvarion. Aliás, o
mercado de alta tecnologia tem viabilizado uma série de empresas israelenses de
sucesso, à medida em que ele se abre e dentro para fora. Desde há muito os
israelenses são especialistas em tecnologia de mobilidade. É sempre bom ficar
de olho no que eles aprontam. Nos alemães também.
Então toda esta explicação sobre os fatores chaves da
mudança de cenário foi para demonstrar a transformação porque passa o chamado
ecossistema do mercado. Ou seja, não dá mais para ficar no belo jardim murado,
contemplando seu crescimento constante (graças aos clientes fiéis). Está todo
mundo de tacape em punho, prontos para a briga por novos mercados.
Querem exemplos? Numa
apresentação ao mercado, ocorrida em maio, na Bolsa de Estocolmo, Hans
Vestberg, CEO da Ericsson, uma das mais tradicionais fornecedores do mundo de
telecom, salientou que, embora as telcos continuem como prioridade em sua
estratégia de atuação, há “vigor” (palavra deles) para
abordar clientes como TV a cabo, governos, saúde, transporte e
utilities. “Estes são setores onde há uma enorme necessidade de serviços de
telecomunicações”, afirmou ele. Governo e mercado de difusão de vídeos constam
de todas as novas estratégias de quem fornece insumos e serviços de
comunicação. Vou dar também
alguns exemplos sobre mercado financeiro, embora a contragosto. Trata-se de um
mercado muito volátil e sensível. E não se conhece ainda as conseqüências do
acordo de urânio feito entre o Brasil e a Turquia junto aos investidores
mundiais. Mas a Copa do Mundo e as Olimpíadas estão aí e isto de fato é um ponto
positivo muito forte. Além disso, são grupos fortes que lidam com muito
dinheiro… A gente imagina que a preocupação deles seja maior do que a nossa…
Quando a Associação de Empresas de Investimento (AIC),
com sede em Londres, pediu – em dezembro passado - que os seus gestores de
fundos de investimento apontassem os mercados com perspectivas de alto
desempenho para 2010, os mercados emergentes ficaram no topo com 35% dos votos.
Entre as regiões, a América Latina, com 22%, e o Extremo Oriente, com 18% dos votos.
Slim Feriani, diretor executivo da Advance Emerging
Capital disse na ocasião que “o desempenho das ações dos mercados emergentes
ultrapassaram generosamente o dos mercados desenvolvidos nos últimos cinco anos
e esperamos que esta alta performance continue durante os próximos cinco anos”.
O executivo usou uma expressão bem característica de que
os mercados emergentes são os “vencedores relativos” da crise do subprime
e da recessão resultante. Uma das razões desta situação é que a renda das
famílias dos mercados emergentes nunca foi tão forte em comparação com países
desenvolvidos, como atualmente. E a firma de investimentos dos EUA acredita que
este desenvolvimento econômico e o crescimento dos lucros das empresas
continuarão a ultrapassar facilmente o mundo desenvolvido, tanto em termos
nominais quanto reais no futuro previsível”.
Outra gestora mundial de fundos de ações, a Asset
Management, acredita que os mercados emergentes vieram para ficar. “A crescente
pressão sobre os consumidores ocidentais e as finanças públicas são
susceptíveis de se traduzir em dados macroeconômicos mais fracos e em pressão
sobre a receita de muitos anos. Os investidores que buscam o crescimento em
longo prazo nos mercados emergentes tendem a olhar de forma cada vez mais atraente
e já vemos um mar de mudanças nas atitudes de risco para o investimento nestes
mercados”.
E como comprova o fator número dois,
a busca não é apenas por novos mercados usuários, mas novos mercados
geográficos. Cameron escolheu o Brasil para o lançamento mundial do filme
Avatar. Popstars de primeira linha colocam as cidades dos países sul-americanos
no topo das agendas de suas turnês.
Escrito
em 22 de Junho de 2010
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